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Como é que se consegue dizer que um indivíduo está sexualmente interessado? No caso particular dos machos, pode dizer-se que é bastante óbvio. O reino animal está repleto de exemplos em que os machos fazem de tudo um pouco para mostrarem que estão sexualmente interessados por uma fêmea, e fazem-no com uma insistência francamente implacável. As suas exibições vão desde esplêndidas apresentações teatrais, às mais sublimes melodias e até a danças com coreografias de rara beleza.
Nas moscas-das-frutas, por exemplo, os machos perseguem a fêmea enquanto produzem uma canção de corte usando as suas asas. Já o comportamento da fêmea envolve geralmente pequenos atos de rejeição. Por este motivo, não é de estranhar que encontrar uma forma de definir a recetividade feminina não seja uma tarefa fácil.
Num estudo publicado na revista Scientific Reports, investigadores do Centro Champalimaud em Lisboa revelam, com recurso a ferramentas genéticas e comportamentais avançadas, que a velocidade com que as fêmeas andam é o indicador-chave da recetividade feminina e identificam neurónios que controlam o acasalamento na mosca da fruta.
“Os rituais de acasalamento são parte integrante dos atos sexual e reprodutivo”, diz Maria Luisa Vasconcelos, investigadora que liderou o estudo. “Como acontece na maioria das espécies, incluindo as moscas da fruta, é a fêmea quem decide se quer ou não copular com um determinado macho, mas até agora não se sabia de que forma este animal expressava o seu interesse e muito menos quais os circuitos neurais que o sustentam.”
Com o objetivo de descobrir como é que o cérebro controla o comportamento de recetividade neste animal, Vasconcelos e a sua equipa testaram vários tipos de neurónios e encontraram um tipo que consideraram logo como um forte candidato. “Quando silenciávamos a atividade deste tipo particular de neurónios, conhecidos como neurónios apterous, no cérebro de moscas fêmeas, estas exibiam uma redução significativa na sua recetividade em relação aos machos.”
Depois dos investigadores terem identificado que a manipulação deste conjunto específico de neurónios levava as moscas a parar de acasalar, decidiram caracterizar de forma detalhada o comportamento das fêmeas e perceber o que tinha mudado. “Há muitas possibilidades, mas descobrimos que apenas uma característica comportamental estava a ser alterada e de facto nunca observámos uma diminuição no ritmo de caminhada destas fêmeas.”

“Este resultado deixou-nos muito entusiasmados.”, diz Márcia Aranha, a primeira autora do estudo, “Em estudos anteriores a modulação da velocidade da caminhada feminina já havia sido sugerida como um sinal de receptividade, mas só agora com estes novos resultados é que se tornou algo claro.”
Mas este foi apenas o primeiro passo. Como Aranha explica, os autores deste estudo tiveram que descartar muitos fatores antes que terem certeza de que os neurónios que encontraram estavam de forma específica a controlar a recetividade feminina. “Tivemos que nos certificar de que silenciar a atividade destes neurónios não resultava em deficits motores ou sensoriais que estariam consequentemente a alterar o comportamento da mosca, tornando-a menos recetiva, por exemplo, fisicamente incapaz de abrandar ou até mesmo incapaz de perceber a presença do macho cortejador.”
O próximo passo foi a realização de uma série de experiências essenciais para a validação da especificidade destes resultados. “Primeiro, verificámos que a locomoção das moscas estava intacta. Os nossos dados mostram que o silenciamento dos neurónios só afetou a velocidade de marcha da mosca durante o cortejamento e permaneceu normal em todas as outras situações testadas. Depois, avaliámos parâmetros sensoriais, auditivos e olfativos, que sabemos serem críticos para que a fêmea consiga avaliar o sexo masculino, mas dada a localização anatómica dos neurónios identificados parece-nos improvável que estejamos a alterar a capacidade de cheirar ou ouvir da fêmea.”, esclarece Aranha.
Para além destas experiências foram ainda incluídos testes adicionais e todos os dados indicavam o mesmo resultado, isto é, os investigadores tinham descoberto um conjunto de neurónios no cérebro que controla aquilo que parece ser um indicador-chave da recetividade feminina.
E agora? Qual o próximo passo? “Agora queremos olhar para os circuitos, as redes neurais onde estes neurónios estão integrados. Estes neurónios podem ser responsáveis pela integração de diferentes tipos de informações sobre o macho. Desta forma, quando silenciados, mesmo que a fêmea esteja ciente da presença do macho, ela não é capaz de fazer uma avaliação global adequada e é por isso que ela não consegue abrandar. Estamos a testar esta hipótese e esperamos conhecer a resposta em breve “, conclui Vasconcelos.
Liad Hollender works as a Science Writer at the Science Communication Office at Champalimaud Research
Edited and translated by: Catarina Ramos(Science Communication office). Illustration credit: Gil Costa(Science Communication office)
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